Na segunda metade desta década, o número de usuários de redes sociais no planeta praticamente dobrou, de acordo com o relatório Digital 2019 Global Digital Overview da We Are Social, passando de 1,9 para 3,5 bilhões de pessoas.
Nesse período, a sociedade passou por mudanças significativas, em diferentes geografias. Megatendências como Imaterialização, Democratização, Polarização e Sociedade do Conhecimento, entre outras, combinaram-se para promover uma fluidez sem precedentes nas relações individuais, coletivas e institucionais.
Tudo está mais dinâmico e parece menos estruturado, mais acelerado e complexo.
A tecnologia facilita e incentiva a conexão coletiva, mas, individualmente, estamos nos desconectando das referências históricas e em busca de propósitos genuínos.
Este é um dos paradoxos característicos da década.
As redes sociais oferecem um interessante campo de pesquisa para acompanhar a fluidez de nossa era.
Tomemos o Youtube como exemplo.
No início da década, 6 entre os 10 canais com mais seguidores eram de humoristas norte-americanos, 4 deles ocupando a primeira posição do ranking. O líder, Nigahiga, tinha pouco mais de 3 milhões de inscritos em seu canal.
Entre 2012 e 2014 os gamers assumiram a liderança do ranking. O mais popular entre eles, o sueco Pew Die Pie, conquistou a primeira posição em 2013, posto que manteve até o início de 2019.
De 2015 a 2017 a música ganhou terreno com Rihanna, One Direction, Eminem, Taylor Swift, Justin Bieber, Katy Perry e Germán Garmendia ocupando 7 das 10 posições.
No segundo semestre de 2019 o cenário dos top 10 não poderia representar melhor a diversidade de interesses e geografias: a liderança dividida entre um canal de música indiano (T-Series) e um gamer sueco (Pew Die Pie) – ambos na casa dos 100 milhões de seguidores, uma disputa apertadíssima do terceiro ao sexto posto entre a Sony indiana (SET-India), um canal de ‘do it yourself’ do Chipre (5-minute craft), o funk brasileiro (Kondzilla), e desenhos infantis norte-americanos (Cocomelon), e o mexicano humorístico (Badabun) disputando espaço com dois canais de eventos esportivos norte-americanos (WWE e Dude Perfect) e Justin Bieber nas quatro últimas posições.
Chama a atenção o fato de que apenas três das dez primeiras posições estão ocupadas por youtubers ‘solo’ (Pew, Kondzilla e Justin). Nas demais posições temos canais mais estruturados de conteúdos, que poderíamos chamar de ‘marcas de mídia’, encontrando o caminho do engajamento em redes sociais.
O gráfico animado com a evolução dos Top 10 pode ser acessado neste link.
Nas redes mais interativas, de acordo com a Stilingue, startup brasileira especializada em ‘escuta social’, Política, Futebol, Entretenimento, Segurança e Tecnologia dominaram os temas dos ‘trend topics’ (Twitter e Google) durante o mês de Setembro/19 no país.
A conclusão é que a fluidez vem se acelerando e, aparentemente, celebridades e causas já não têm o mesmo poder de retenção da atenção coletiva por períodos mais longos, com raras exceções.
A Busca de Propósito vai se consolidando como uma megatendência e as redes sociais são os locais mais confortáveis para esse exercício.
Entretanto, vários estudos realizados, principalmente a partir de 2017, relacionam o aumento dos níveis de ansiedade da população ao uso das redes sociais. Os norte-americanos criaram, recentemente, um termo para caracterizar esse fenômeno: Social Anxiety Disorder (desordem de ansiedade social).
Nada que desabone as redes sociais em sua essência. Simplesmente, o que buscamos não está lá.
Os caminhos para conexão individual e a busca de propósito são outros, mais vivenciais, e as redes sociais podem, inclusive, contribuir para isso de forma complementar.
Se esta década foi a marcada pela conexão digital, coletiva, é bem possível que a próxima seja lembrada pela busca de propósito através de vivências presenciais que facilitem a reconexão individual.
As startups do futuro próximo prometem ser bem mais interessantes.
Flavio Ferrari
Head BR - CIFS | Copenhagen Institute for Futures Studies
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